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Islay, a Ilha do Whisky — Parte Final

Por Alexandre Campos

Na manhã do dia 30 de agosto de 2010 visitei a Bowmore, uma das minhas destilarias preferidas. Tive a honra de ser convidado a fazer seu tour mais exclusivo, tendo David Angus Turner, o chefe do processo de destilação, como meu tutor. David trabalha na destilaria há mais de 25 anos. Orgulhoso, admite que a Bowmore é grande parte da sua vida.

Destilaria Bowmore

 

Fundada em 1779, a destilaria é controlada atualmente pelo gigante grupo japonês Suntory, e rivaliza com a Macallan, de Speyside, em termos de prestígio. O Single Malt da Bowmore é menos esfumaçado que o Laphroaig, Lagavulin ou Ardbeg. Isso é explicado pelo fato de que a Bowmore defuma o seu malte a 25ppm de fenóis.

Ao fim do passeio, tive a oportunidade de provar todos os Single Malts da Bowmore. Foram tantos, todos assessorados por David que dizia: “Prove este e veja o que acha. E esta outra versão, que tal?” Perguntei ao meu tutor qual era o melhor whisky que ele tinha tomado na vida, e a resposta foi imediata: “Black Bowmore”. Esse Single Malt, lançado em pouquíssimas quantidades, foi envelhecido em barris de vinho Jerez Oloroso e hoje custa em torno de R$ 10,000. É encontrado principalmente em leilões de whisky.

Hora do sacrifício: provar toda a seleção de whiskies da Bowmore

 

Minha última parada em Islay foi na Kilchoman. Fundada em 2005, é a primeira destilaria construída em Islay nos últimos 124 anos e a mais jovem da Escócia. Em um mercado onde tradição é importante, a Kilchoman não deixa nada a desejar aos grandes e tradicionais nomes da indústria. Eu, particulamente, sou um fã incondicional da Kilchoman e tenho todas as versões de Single Malts lançadas pela destilaria até o momento.

Por ser uma destilaria ainda muito jovem, a Kilchoman só lançou até agora versões de Single Malts envelhecidas por 3 anos (o mínimo de envelhecimento pela legislação escocesa) em barris que envelheceram previamente whisky bourbon americano e vinho Jerez. Seu Single Malt é equilibrado, balanceado e rico em aromas e sabores. Uma obra-prima recém-criada em Islay.

Em minha visita à destilaria, tive por cicerone ninguém menos que o gerente geral John Maclelland, que trabalhou também por quase 21 anos na Bunnahabhain, outra destilaria de Islay. John me contou que a “Kilchoman é uma das 7 remanescentes destilarias de whisky na Escócia que fazem seu próprio processo de maltagem da cevada. As outras são: Balvenie, BenRiach, Bowmore, Highland Park, Laphroaig e Springbank”.

Armazém da Kilchoman com John Maclelland ao fundo

 

A Kilchoman foi o encerramento perfeito da minha passagem pela bonita, mística e agradável ilha de Islay. Não vejo a hora de retornar a esse lugar onde as pessoas guardam as tradições, a cordialidade, o respeito e a solidariedade, além de produzirem um dos melhores destilados do mundo.

Mais relatos de nossas viagens pelo mundo do whisky ainda estão por vir…

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Islay, a Ilha do Whisky (e o Yellow Submarine) — Parte III

Por Alexandre Campos

Ao chegar a Port Ellen, fui recebido no pequeno hotel (com honras de Estado…) pelo dono, Harold Hastie. Acho que não é todo dia que um brasileiro aparece perambulando pela ilha.

Harold e sua esposa Margaret são nativos de Islay e donos do “The Grange Guesthouse”, um charmoso “B&B” em Port Ellen. Harold é também pescador e membro da guarda costeira de Islay. Uma figura lendária e divertida que me fez várias perguntas sobre como é a vida no Brasil.

Nossa interessante conversa se prolongou por várias horas. O papo era regado por excelentes Single Malts que Harold ganha de seus amigos das destilarias de Islay, e de outras regiões da Escócia. A popularidade de Harold é tão grande em Islay que três Single Malts foram produzidos em sua homenagem, o mais famoso deles batizado de “Yellow Submarine”. Trata-se de uma edição especial de 12.000 garrafas da Bruichladdich, outra destilaria de Islay, lançada em 2005 em comemoração a um incidente muito interessante ocorrido na ilha.

Harold Hastie exibindo as garrafas em sua homengem

 

Harold começa a contar a história que o deixou ainda mais famoso no lugar.

Em meados de 2005, a marinha de guerra britânica fazia um treinamento tático na costa de Islay quando, por puro esquecimento, deixou para trás seu caro e importante mini-submarino. Operado por controle remoto e usado para detectar minas, o equipamento foi apelidado de “Yellow Submarine”, dada a cor amarela e a semelhança com o desenho imortalizado junto à famosa canção dos Beatles.

We all live in a Yellow Submarine, Yellow Submarine...

Por obra do destino, o “Yellow Submarine” foi encontrado justamente pelo meu anfitrião Harold, que o rebocou até o jardim da sua casa. Avisada por ele do achado, a marinha britânica não deu a menor bola para o feito e, em princípio, recusou-se a admitir que havia perdido o equipamento (que custa ao redor de R$ 1.5 milhão).

Não tinha dúvida de que estava ali ouvindo uma legítima história de pescador, mas essa verdadeira, pois inúmeras doses de whisky depois, Harold me dizia: “Alex, aqueles idiotas da marinha não quiseram admitir o erro. O “Yellow Submarine” ficou mais de 3 meses no meu jardim e virou até atração turística. Eu me divertia com os nossos habituais turistas japoneses vindo até aqui para tirar fotos…”.  Dada a fama do “Yellow Submarine” e o interesse da imprensa no caso, a marinha não teve outra saída senão assumir o erro e resgatar o aparelho do quintal de Harold. Foi um dos melhores casos que já ouvi na vida!

Na tarde do dia 29 de Agosto de 2010 Harold me deu carona até o hotel Lochside, na vila de Bowmore onde eu iria passar a noite. O bar do hotel Lochside tem mais de 300 diferentes Single Malts, todos de Islay. Um convite irresistível para alguém que, como eu, gosta de um pouco de fumaça no whisky.

We all live in a yellow submarine, yellow submarine, yellow submarine. We all live in a yellow submarine, yellow submarine, yellow submarine…

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Islay, a Ilha do Whisky — Parte II

Ao chegar a Laphroaig, pude perceber que estava diante de mais outra grande e tradicional destilaria escocesa. Construída em 1810, a destilaria seguiu produzindo ilegalmente até 1815, quando então recebeu licença oficial para a produção de whisky. Atualmente, a Laphroaig pertence ao grupo Beam, os mesmos donos do famoso Bourbon Jim Beam e do Blended escocês Teacher’s, que leva bastante malte da Laphroaig, por sinal.

O príncipe Charles já esteve por lá duas vezes. Na primeira visita, em 1994, sua alteza quase morre ao tentar pousar o avião que pilotava em alta velocidade. Na segunda vez, em 2008, já casado com Camilla Parker, a visita do Príncipe se deu sem sustos. Fotos do ilustre visitante estão espalhadas por toda a destilaria, da qual o príncipe é grande fã. Dizem que seu Single Malt favorito é o Laphroaig 15 anos, já retirado de circulação e substituído pela versão de 18 anos.

A visita a esse verdadeiro templo do whisky foi marcante. Entre os momentos inesquecíveis está a hora em que passei a fazer parte do “Friends of Laphroaig”, fincando a bandeira do Brasil no pequeno pedaço de terra que me alocaram na destilaria… Também tive a oportunidade de ver pela primeira vez um depósito com “peat”, a turfa que é colocada no forno para secar a cevada maltada. É por causa dessa turfa que o Single Malt da Laphroaig e os de Islay, excluindo o Bunnahabhain, tem um peculiar sabor enfumaçado.

Peat Store - Depósito de Turfa da Laphroaig

 

O Laphroaig também tem um forte sabor medicinal que nem sempre é encontrado em outros maltes turfados de Islay. Curiosamente, essa característica permitiu que ele fosse exportado para os EUA como remédio, durante o período da Lei Seca americana.

Terminada a segunda visita, peguei carona até a Lagavulin com um grupo de alemães fascinados por whiskies. Fundada em 1816, a destilaria pertence atualmente à Diageo, os mesmos donos da marca Johnnie Walker.

Minha passagem pela Lagavulin foi rápida, já que a destilaria estava em manutenção anual e fechada para visitação. Após saborear uns bons Single Malts na aconchegante sala de estar deles e comprar algumas garrafas raras, segui com meus novos amigos alemães para a vila de Port Ellen, onde passaria a noite antes de ir para a vila de Bowmore.

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Islay, a Ilha do Whisky — Parte I

Por Alexandre Campos

Islay (pronúncia “ai-lá”) é uma pitoresca e convidativa ilha situada na costa oeste da Escócia, na altura de Glasgow. Dona de uma paisagem única, a ilha apresenta uma atmosfera bucólica aos seus 3.500 habitantes, e tem os campos de golfe entre seus principais atrativos. Mas para aqueles que não apreciam o nobre esporte, Islay oferece algo ainda mais especial. A ilha abriga sete das principais destilarias de whisky da Escócia.

Os maltes de Islay, com seu peculiar sabor de turfa queimada, ganharam prestígio e um status “cult” por admiradores do mundo inteiro. Todo apreciador sério de Single Malt whisky tem ao menos um de Islay entre seus preferidos — o meu é o Lagavulin. E não é por menos. Frequentemente os Single Malts de Islay atingem notas altíssimas em degustações conduzidas por whisky connoaisseurs de todo o mundo.

Como seguidor do culto ao bom malte, minha peregrinação por Islay começou em uma manhã de sábado, dia 28 de agosto de 2010. No aeroporto me esperava o taxista Mr. Lamont Campbell, que ao ver minha câmera fotográfica logo perguntou se aquela era uma visita jornalística. Respondi que meu negócio não eram as letras, e que as únicas que me levaram até ali eram as dos rótulos das garrafas de whisky… Para minha surpresa, Lamont revelou: “gosto mais de vinhos, mas de vez em quando aprecio uns whiskies Blended, que são mais suaves que os Single Malts”. Segui conversando com meu novo amigo sobre o Brasil e a Escócia, enquanto apreciava a paisagem pela janela até chegarmos à Ardbeg.

Ardbeg — A primeira parada em Islay

 

A destilaria, fundada em 1815, passou por várias crises e chegou a fechar em algumas ocasiões. Minha guia por lá foi Bryony MacIntyre, uma jovem estudante de Engenharia Química de Glasgow que, apesar da pouca idade, sabe tudo sobre as técnicas de destilação e fermentação, fazendo jus a sua faculdade. A jovem disse que reserva os verões para o trabalho na destilaria, da qual o pai, Ruaraidh MacIntyre, é “stillman”. Ou seja, é Ruaraudh quem opera os destiladores da Ardbeg, uma das principais funções dentro de uma destilaria de whisky. Nesse clima familiar, Bryony revela: “boa parte da minha família trabalha ou trabalhou na Ardberg ou em alguma das destilarias de Islay”. A jovem é atualmente embaixadora da destilaria na Escandinávia.

Bryony me explicou que a Ardbeg esteve fechada de 1981 a 1989 (duros tempos os de “80″, e década perdida na América Latina). Em 1997, foi comprada pela Glenmorangie Plc, a famosa destilaria nas Highlands que pertence atualmente ao grupo francês Louis Vuitton Moet Hennessey (LVMH). Mesmo passando por tantas provas, a Ardbeg segue em funcionamento, produzindo um dos maltes mais saborosos e enfumaçados de toda a Escócia. O malte da Ardbeg contém 55ppm de fenóis, medida acima da média de 35ppm de fenóis das outras destilarias de Islay. Ao final de minha visita tive o enorme prazer de saborear com Bryony várias edições dos Single Malts da Ardbeg. A menina não só entende de whisky, como também aprecia a bebida.

Uma estante repleta de preciosidades

 

Meu passeio pela Ardbeg havia chegado ao fim. Diante da possibiliadade de chuva, a funcionária do centro de visitação, Emma McGeachy,  gentilmente me ofereceu um carro da própria destilaria para que me levasse à próxima parada: Laphroaig. Durante minha estada em Islay, pude comprovar que a boa vontade dos seus habitantes é tão comum como as mudanças de clima naquela região. Sentia-me em casa com tamanha hospitalidade…

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